O Caso dos Amendoins

Revisado e Analisado por Mauricio Moura

     “Tudo o que é preciso saber antes de ampliar seu negócio – ou de como há mais coisas entre você e seu lucro do que pode imaginar a vã filosofia.”

     Joaquim Fernandes, dono de uma pequena casa de lanches rápidos, decidiu colocar sobre o balcão de seu estabelecimento uma prateleira com alguns saquinhos de amendoins, na esperança de faturar um dinheiro extra. Comunicou a importante decisão a seu homem de confiança, o contador, que de tão perspicaz e rápido em entender seus pontos de vista, sempre parecera a Joaquim um Super Herói da Teoria das Finanças. Aqui a conversa que se seguiu entre os dois:

     S-HTF – Sr. Joaquim, o senhor disse que colocou estes amendoins aqui no balcão porque alguns clientes estavam pedindo… mas eu pergunto: será que o senhor sabe mesmo quanto tais amendoins vão lhe custar?

     JOAQUIM – Do que você está falando? É claro que não vão custar grande coisa. Amendoim é artigo barato. Por isso, vão dar lucro, um belo lucro. Eu paguei R$ 800 por essa prateleira, assim os amendoins vão chamar mais a atenção dos fregueses, mas essa despesa é praticamente nada. Depois, cada saquinho vai me custar R$0,80 e eu vou vender por R$ 3. Espero vender 50 por semana para começar. Se tudo correr como eu imagino, em nove semanas cubro os custos da prateleira. Depois disso, passo a ganhar R$ 2,20 em cada saquinho de amendoim.

     S-HTF – Lamento dizer Joaquim, mas essa é uma abordagem antiquada, ultrapassada e absolutamente não realista. Não é assim que se raciocina, quando se quer decidir pela ampliação de um negócio. Felizmente, os modernos procedimentos contábeis permitem traçar um quadro mais preciso da situação, que indiscutivelmente revelará complexidades subjacentes, importantíssimas de se levar em conta antes de seguir em frente.

     JOAQUIM – O quê?

     S-HTF – Calma calma, eu explico. O senhor não pode pensar nesses amendoins isoladamente. Eles devem ser integrados às operações comerciais. Isso significa que os amendoins precisam arcar com sua parcela nos custos gerais do negócio. Eles não podem de maneira alguma ficar alheios à parte que lhe cabe nos gastos com aluguel, aquecimento, luz, depreciação dos equipamentos, decoração, salários das garçonetes, do cozinheiro.

     JOAQUIM – Do cozinheiro? Mas o que é que o cozinheiro tem a ver com os amendoins? Ele nem sabe que eu tenho os amendoins!

     S-HTF – Veja bem Joaquim, acompanhe o meu raciocínio. O seu cozinheiro está, como não poderia deixar de estar, na cozinha. A cozinha que prepara a comida, é a comida que atrai as pessoas para cá, e são as pessoas que perguntam se o senhor tem amendoins para vender. É por isso que o senhor deve fazer com que os amendoins paguem uma parte do ordenado do cozinheiro, e também uma parte de seus próprios ganhos. Nestas contas que eu fiz com cuidado, levando em consideração todos os custos da casa, fica bem claro: o negócio dos amendoins precisa arcar, anualmente, com R$ 12.800,56 das despesas gerais.

     JOAQUIM – Os amendoins ? 12.800 por ano de despesas gerais? Os amendoins?

     S-HTF – Na ponta do lápis, é um pouco mais do que isso. Não se pode esquecer que o senhor também gasta dinheiro todas as semanas para lavar as panelas, para mandar varrer o chão e para repor os sabonetes no toalete. Com isso, os custos atingem R$ 13.313,13 ao ano.

     JOAQUIM – (pensativo) Mas quem me vendeu os amendoins garantiu que eu ia ganhar um bom dinheiro com eles. É só colocar os saquinhos à vista do freguês e ir faturando 2,20 de lucro em cada saquinho, ” ele me disse”.

     S-HTF – (com um certo ar de superioridade) Acontece que esse vendedor não é um teórico em finanças, como eu. Não leva os detalhes em conta. Por exemplo, o senhor sabe quanto vale aquele canto do balcão onde está a prateleira dos amendoins?

     JOAQUIM – Que eu saiba, nada. Não me serve para nada, é só um pedaço de balcão sem utilidades.

     S-HTF – Um enfoque moderno de custos não permite a existência de locais “sem utilidades” em um negócio. O seu balcão tem cerca de 6 metros quadrados, e fatura em torno de 250 mil por ano. Calculei com precisão o espaço ocupado pela prateleira dos amendoins e posso afirmar que ela lhe custa R$15 mil por ano. Como a prateleira esta impedindo que o balcão seja usado, não há outra alternativa senão comprar a ocupação local.

     JOAQUIM – Isso por acaso quer dizer que eu vou ter de repassar mais esses 15 mil para o preço dos meus amendoins?

     S-HTF – Exatamente. O que elevaria sua parcela de custos operacionais gerais com os amendoins para um total final e definitivo de 28.313 e 13 centavos por ano. Ora como o senhor pretende vender 50 saquinhos de amendoins por semana, se efetuarmos a alocação dos custos, vamos constatar que estes saquinhos deverão ser vendidos a R$10,90 cada um.

     JOAQUIM – O quê????

     S-HTF – Ah! Ainda estamos esquecendo uma coisa: a esse preço, deve ser acrescentado o custo de compra de R$ 0,80 por saquinho, o que perfaz um total de R$ 11,70. Desse modo, o senhor há de compreender que, vendendo os amendoins a 3 Reais, como era sua intenção, estará incorrendo num prejuízo de 8,70 em cada venda.

     JOAQUIM – Mas isso é uma loucura!!!!

     S-HTF – De jeito nenhum! Números não mentem jamais, eles provam que seu negócio de amendoins não tem futuro.

     JOAQUIM – (com ar de quem descobriu o pulo-do-gato) E se eu vender muito, muito amendoim, digamos mil saquinhos por semana, em vez de 50?

     S-HTF – (com toda a paciência do mundo) Sr. Joaquim, parece que o senhor não compreende o problema. Se o volume de vendas aumentar, seus custos operacionais também aumentarão. O senhor terá mais trabalho, isso lhe tomará mais tempo e, como haverá mais mercadoria em jogo, a depreciação será maior. O princípio básico da contabilidade é inequívoco nesse ponto:
“Quanto maior a operação, maiores as despesas gerais a serem alocadas. “Não, não, infelizmente aumentar o volume de vendas não vai ajudar neste caso.

     JOAQUIM – Tudo bem, tudo bem. Então, o que é que eu faço?

     S-HTF – (condescendente) Bem… O senhor poderia reduzir os custos operacionais. Para começar, mude-se para um prédio de aluguel mais barato. Depois, reduza os salários de seus funcionários. Passe a lavar as janelas a cada 15 dias e mande varrer o chão só as quintas-feiras. Acabe com a mordomia do sabonete na pia do toalete. Diminua o valor por metro quadrado do seu balcão. Se com tudo isso o senhor reduzir suas despesas em 50%, a parcela que cabe aos amendoins cairá para R$14.156 e 57 centavos. Aí , os amendoins poderão ser vendidos a R$5,84 o saquinho

     JOAQUIM – (desconfiado) E isso é melhor?

     S-HTF – Muito, muito melhor. Mas mesmo assim o senhor estará perdendo R$ 2,84 por saquinho se cobrasse apenas os R$ 3 que pretendia. Para ter lucro, se o senhor quer mesmo ganhar R$ 2,20 por saquinho, terá de vender cada um a R$ 8,04.

     JOAQUIM – (pasmo) Você quer dizer que, mesmo depois de cortar meus custos operacionais pela metade, eu ainda vou ter de cobrar 8,04 por um saquinho de amendoins? Ninguém é bobo de pagar esse preço! Quem é que vai querer comprar os meus amendoins?

     S-HTF – Esses são outros quinhentos, Sr. Joaquim. O fato é que a R$ 8,04 o senhor estaria vendendo amendoins a um preço baseado numa real e relevante estimativa dos seus custos já reduzidos.

     JOAQUIM – (afobado) Olhe aqui, eu tenho uma idéia melhor. Por que eu não jogo fora de uma vez esses malditos amendoins? Que tal se eu colocar todos eles no lixo?

     S-HTF – O senhor pode se dar a esse luxo?

     JOAQUIM – Mas é claro. Eu só comprei 50 saquinhos, que me custaram uns trocados, apenas. Minha maior despesa foi com a prateleira, mas tudo bem, prefiro perder esse dinheiro e cair fora desse negócio maluco.

     S-HTF – (balançando a cabeça) Aí é que o senhor se engana; as coisas não são assim tão simples. Afinal, o senhor já ingressou no ramo dos amendoins, e no instante em que se desfizer deles estará acrescentando R$ 28.313 e 13 centavos – a parte deles, no seu negócio – às despesas gerais anuais de sua operação. Portanto, seja realista: será que o senhor pode mesmo encerrar as vendas dos amendoins?

     JOAQUIM – (arrasado) Eu não acredito! Na semana passada, eu era um próspero comerciante, tinha pela frente a perspectiva de um dinheiro a mais e agora estou aqui, metido numa complicação daquelas só porque eu pensei que uns amendoins no balcão poderiam melhorar o meu caixa.

     S-HTF – (erguendo a sobrancelha) Vamos, vamos Sr. Joaquim, não é o fim do mundo. Ainda bem que nós temos essas análises modernas de custos. Sem elas, como poderíamos desfazer falsas ilusões como essa dos seus amendoins?

School of Business Administration The University of Western Ontano

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